L. R. Arcano

Folclore | Selkies, as Sereias da Mitologia Celta

Selkie da Mitologia Celta

Imagine uma bela tarde ensolarada à beira-mar. As ondas batem nas rochas em um movimento rítmico e eterno, criando um cenário de pura harmonia natural. Ao longe, algo chama sua atenção – uma figura imóvel nas finas areias douradas. Inicialmente, parece ser apenas uma foca, uma criatura marinha qualquer. Mas, em um piscar de olhos, a figura começa a mudar. O que era uma foca se levanta, se tornando bípede, e então, diante dos seus olhos, revela-se a silhueta graciosa de uma mulher. Nesse artigo, conheça as Selkies: criaturas parecidas com sereias presentes no folclore celta.

A Lenda dos Povos-Foca, ou Selkies

Originários das costas da Irlanda, Escócia, Islândia, Ilhas Faroé e outras regiões remotas, os Selkies são criaturas mitológicas que habitam a fronteira entre o mundo terrestre e o marinho, tecendo histórias de amor, perda e transformação. Capazes de mudar de forma, essas figuras fascinantes podem alternar entre a vida como focas e como humanos, em uma metamorfose que desafia os limites da natureza.

Conhecidos nas lendas antigas como o Povo Foca, os Selkies vivem nas águas, seu habitat natural, na forma de focas comuns, comportando-se como qualquer outro animal marinho. No entanto, ao pisarem em terra firme, eles se despem de sua pele de foca, revelando uma forma humana encantadora, irresistível aos olhos de quem os contempla. Sua dualidade os torna figuras misteriosas e, ao mesmo tempo, trágicas, sempre divididas entre o chamado do mar e a atração do mundo humano.

A Natureza das Selkies

A natureza dos Selkies é marcada por uma dualidade intrigante: essas criaturas marinhas podem ser tanto amigas e prestativas quanto perigosas e vingativas, dependendo das circunstâncias. Sua sedutora forma humana, presente tanto em homens quanto em mulheres, é uma característica central nas lendas que os cercam. Usando seu charme irresistível, os Selkies atraem e seduzem humanos, envolvendo-os em relacionamentos intensos e passageiros. No entanto, esses encontros raramente terminam bem para os humanos envolvidos; após terem conquistado o que desejavam, os Selkies frequentemente retornam ao mar, abandonando seus amantes e até mesmo filhos concebidos em terra, sem olhar para trás.

Homem Selkie - Mitologia
Representação de um Selkie Masculino

Lendas como a de The Great Silkie of Sule Skerry ilustram bem essa dualidade. Neste conto, um Selkie masculino seduz uma mulher humana, gerando um filho. Ele então retorna para o mar, deixando a mulher sozinha para criar a criança. Mais tarde, ele aparece para levar o filho de volta ao oceano, exemplificando o caráter mutável e às vezes cruel desses seres mágicos. Essas histórias servem como lembretes de que a beleza e o encanto das Selkies vêm sempre acompanhados de um profundo e inescapável anseio pelo mar.

Transformações e Trágicas Consequências: A Lenda da Selkie de Mikladalur

Nas lendas, as Selkies só podiam retornar à sua forma marinha com a ajuda de suas peles de foca, que removiam ao se transformar em humanos. Se perdessem ou tivessem suas peles roubadas, ficavam condenadas a viver o resto de suas vidas em terra, despojadas de seus poderes – um destino trágico para essas criaturas mágicas.

Os humanos, sempre astutos, exploravam essa vulnerabilidade para enganar e capturar Selkies, obrigando-as a casar-se com eles. Uma das lendas mais conhecidas envolvendo essas criaturas ilustra bem esse tema. No folclore das Ilhas Faroé, conta-se a história de um pescador que, ao avistar um grupo de Selkies dançando à luz do luar em uma praia de Mikladalur, roubou a pele de uma delas. Privada de sua pele, a Selkie foi forçada a se casar com o pescador e a viver como humana, embora seu coração sempre desejasse retornar ao mar, seu verdadeiro lar.

Durante anos, a Selkie viveu cativa no matrimônio, dando ao homem vários filhos, mas jamais abandonando o desejo de reencontrar sua pele e recuperar sua liberdade. Um dia, ela finalmente descobriu o esconderijo onde o pescador havia guardado sua pele. Sem hesitar, a Selkie a vestiu, transformou-se novamente em foca e retornou ao mar, abandonando sua família humana.

Selkies
Uma Selkie se Transformando em Humana

Em algumas versões dessa lenda, o pescador, obcecado por sua esposa Selkie, segue-a até o mar e descobre o lugar onde ela vivia com seu verdadeiro marido e filhos, todos da mesma espécie. Consumido pelo ciúme e pela raiva, ele os mata, desencadeando a vingança da Selkie e de seus semelhantes contra ele e toda a sua comunidade.

Lágrimas ao Mar: Rituais para Chamar um Selkie e Características de Seus Filhos

Nas lendas, mulheres solitárias que desejavam consolo poderiam ir à orla da praia e derramar sete lágrimas no mar. Esse ritual era acreditado para atrair um Selkie do sexo masculino, que vinha oferecer conforto e companhia. Essa prática lembra a lenda brasileira do Boto-cor-de-rosa, que também envolve uma transformação mágica – neste caso, um boto que se transforma em homem para seduzir mulheres.

Selkie Sedutora
Selkie Seduzindo um Pescador

Um detalhe frequentemente mencionado nas lendas é sobre a prole de um relacionamento entre um humano e um Selkie. Os filhos nascidos de tal união frequentemente apresentam características híbridas, como dedos ligados por membranas, uma marca visível da conexão entre o mundo marinho e o terrestre. Esses traços não apenas reforçam a ligação ancestral com o mar, mas também simbolizam a complexidade e a ambiguidade das interações entre Selkies e humanos.

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As Selkies, com sua capacidade de transformação e suas histórias de amor e perda, encapsulam a essência do folclore celta. Essas lendas revelam a fascinante e trágica dualidade desses seres, oferecendo uma perspectiva única sobre o encantamento e os mistérios da mitologia celta. Espero que tenha gostado de conhecer essa incrível lenda!

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